Curupira

Em meio ao verde intenso da floresta, uma figura esguia movia-se com agilidade sobrenatural. Cabelos vermelhos flutuavam ao vento, enquanto pés invertidos deixavam rastros confusos na terra úmida. Curupira, em sua forma feminina, corria, tendo seu rosto marcado por uma expressão de urgência.

"Rápido pequenos, para o sul!" sussurrava ela para um grupo de macacos que se agitavam nos galhos altos, alarmados com o ruído das serras.

À distância, o som do metal contra a madeira era quase ensurdecedor. Homens armados com ferramentas de destruição avançavam, cortando tudo o que encontravam pela frente. Curupira observava de uma colina próxima, seu coração apertado pela dor de cada árvore que tombava.

Curupira tentava resgatar o máximo de animais que podia, mas a maioria, ainda ingênuos para a maldade do homem, não entendiam a urgência e continuavam a brincar.

Com um gesto rápido, ela convocou vinhas e raízes, que brotaram do solo e se enrolaram nos pés dos homens, fazendo-os tropeçar. "Não enquanto eu respirar", murmurava ela.

Mas os homens não se intimidaram. Munidos de machados, cortavam as vinhas, impiedosos. Um deles, o líder, com um olhar cruel, ordenou: "Espalhem o combustível. Vamos acabar com isso de uma vez."

À noite, enquanto a floresta dormia um sono agitado, o fogo foi aceso. Chamas altas engoliram árvores, animais, e o lar que Curupira lutava para proteger. No meio do inferno, ela correu, tentando inutilmente abafar o fogo com folhas molhadas.

As chamas, possuídas pela dor da transmutação, choravam enquanto consumiam tudo o que estava em seu caminho, inclusive todo o delicado corpo de Curupira, não restando senão cinzas.

Ao amanhecer, os primeiros raios de sol filtravam-se através da névoa de fumaça, iluminando a devastação deixada pelo fogo. A floresta, antes vibrante e pulsante com vida, jazia silenciosa, marcada pelas cicatrizes das chamas.

Os homens, já contando a batalha como vencida, sabiam que a guerra contra os elementais ainda iria longe, mas aquela luta eles podiam contar como uma vitória. “Continuem com o desmate”, gritou o lider.

Da folhigem negra, a silhueta de Curupira se ergueu novamente. Seus cabelos, agora um turbilhão de chamas, e sua forma, masculina e imponente, emergia das cinzas. "Por cada vida perdida, haverá vingança", prometeu ele, com uma voz tão profunda quanto um trovão distante.

Os homens, celebrando sua vitória cruel, não notaram a aproximação da vingança encarnada. Curupira, agora uma força indomável, avançou. Cada passo seu fazia o chão tremer, e seus olhos ardiam com um fogo mais feroz que o que consumira a floresta.

Com mata nenhuma em seu caminho, as chamas de Curupira se tornaram tão quentes quanto as prometidas para o inferno, e um por um, os homens encontraram seu fim. Gritos de terror perduraram o dia, e depois, romperam a noite, enquanto Curupira, implacável, cumpria seu juramento. Quando o sol finalmente nasceu, a floresta estava quieta, marcada pelas cicatrizes do fogo, mas sob a vigilância firme de Curupira, pronta para renascer.

Olhando para a mata destruída, ele disse: "A natureza pode ser sua amante ou seu carrasco."

E sob o nascer do novo dia, Curupira desapareceu entre as árvores queimadas, esperando pelo renascimento da sua amada floresta.