A Criatura

Fazia uma década que o homem perseguia a criatura. Nunca a tinha visto; sabia de sua existência apenas através de relatos alheios. Ano após ano, seguia a trilha da criatura, um percurso labiríntico que o levava de Maringá a Londrina, de Foz do Iguaçu a Assunção, de Lima a São Paulo.

As descrições eram tão variadas quanto as páginas de "As Mil e Uma Noites". Alguns falavam de um ser de puro terror, enquanto outros a comparavam a uma pantera ou a um lobo, uma entidade de pelos negros que rondava as noites, uma sombra predadora entre os desatentos.

Uma mulher narrou sua fuga da besta e proclamou que a criatura era o produto de algum gênio maligno, uma entidade escapada das páginas dos antigos mitos. Seu relato terminou com um murmúrio, quase um sussurro: "Dizem que agora ela assombra os arredores de Curitiba".

Com a notícia ainda reverberando em seus ouvidos, o homem colocava seus poucos pertences em uma bagagem e partia em sua busca. Ele precisava tirar uma foto da criatura, precisava ser tanto seu descobridor quanto seu algoz. Queria a cabeça dela em uma estaca.

Em Curitiba, os boatos flutuavam no ar:

"Parece terrível essa criatura," diziam alguns.

"Três vítimas em uma mesma noite," comentavam outros.

"Precisamos encontrar uma forma de nos livrar desse monstro."

O homem passava seus dias coletando testemunhos, registrando cada palavra em seu diário. Ele procurava entender o modus operandi da besta, a chave para desvendar seu mistério.

"Deve ser um Pé-de-Garrafa," sugeriu alguém, "perdido e aterrorizado pelo desmatamento."

Mas tais comentários populares pouco faziam para saciar sua sede por verdades concretas.

"Onde termina a realidade e começa a imaginação?" perguntava-se, perdido em seus pensamentos.

A busca parecia fadada ao fracasso. Sem mais relatos, sem mais pistas, a trilha da criatura se esfumava diante de seus olhos. Até que uma voz murmurou: "Ela foi vista em Criciúma".

E assim, ele retomou sua peregrinação.

"Não, ninguém viu o monstro por aqui. Dizem que está fora do país. Foi vista em Montevidéu."

E o homem seguiu. As cidades eram meros nomes em um mapa; a criatura era seu verdadeiro destino.

Em Montevidéu, após dias de silêncio, um relato emergiu:

"Ayuda. La criatura se llevó a mi hijo de 7 años."

Passou duas semanas na cidade uruguaia, ouvindo relatos esparsos e sem nenhuma orientação útil.

"Ipupiara ha vuelto a asolar nuestras tierras."

Após uma infinidade de histórias estranhas e familiares, veio a notícia: a criatura estava agora em Buenos Aires. Mas, desta vez, o homem não partiu sozinho. Reuniu um exército de caçadores - 20 homens do Rio Grande do Sul, 10 do Uruguai e outros 15 no caminho para a cidade prometida.

Em Buenos Aires, inicialmente, o silêncio e o medo reinavam. Mas, após alguns dias, a criatura atacou novamente: caçadores começaram a aparecer mortos, até que uma noite a criatura atacou enquanto os caçadores armavam uma tocaia.

O líder da expedição, tal como em todas as outras noites e aparições da criatura, estava ausente. Mas os caçadores não podiam esperar e, movidos por um ódio coletivo, perseguiram a besta e tiraram sua vida. A criatura, um híbrido de homem e lobo, não teve chance contra o esquadrão

O homem não foi mais visto, nem naquela terra nem em qualquer outra, restando apenas os restos mortais da criatura.